quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Poesia Viva ( meu Funeral)


Poesia Viva ( ou : Meu funeral)


Quando eu morrer,
não quero flores nem velas,
nem tampouco quero choro

[aqueles entoados em coro]
não quero!


entoem um samba , um rock , um chorinho ou bolero
[ assim espero]


quando eu finalmente partir,
envolvam meu corpo gelado
num lençol esverdeado
imaginem-me a sorrir


repousem-no numa cova rasa
coberta com a terra sagrada,
úmida, arada e fria,
sorvam uma doce sangria,


e nesse dia ainda...
espalhem sobre minha cova
escritos em verso e em prosa,
épicos, concretos, modernos,
[meus doces laços eternos]


então, algum tempo depois,
recolham meus restos em poesia
transformem em lataria
enfim... feliz serei


Eu, poesia enlatada em pó, [voltei].


Maria Júlia Pontes

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Amargo Outono


Apenas uma única mala compunha sua bagagem,
Maria, olhar de revolta, outono de fel, viagem sem volta,

abotoou o paletó, arrancado então aos prantos
com choro de fazer dó, encolhida no seu canto, amargou feito jiló,
só Deus sabe até quando,

do pai que brotou Maria, nasceu o macho que ele urgia
onde será que Maria vai, no segundo óbito do pai?

quem sabe Minas, Bahia, par ou ímpar? tire uma carta,
preocupação sem valia, vá pro raio que te parta!
(nunca teve serventia)

talvez sente-se na varanda e decida o vai-não-vai ensaiando uma ciranda,
afinal órfã já era e vivo estava o pai.



Maria júlia Pontes

Prato do dia






Não só fome ou inexplicável gula, palavras come por compulsão,
inúmeras fúrias desencadeiam um buscar sem pesar,
o peso na boca do estômago zomba e ri,
então, em total asfixia, comprime cada letra tardia que há pouco estava ali,

vomita uma vez mais, gargalha...
como se em transe atingisse o ápice de sua anorexia
enquanto expele sua torpe caligrafia
delira e imagina: - qual será o prato do dia?



Maria Júlia Pontes

Ao pé do ouvido


Hoje o vento soprou doído
segredos ditos ao pé do ouvido,
vento de Agosto profano

sem piedade a ventar
traz meu amor ou me dano
pois só cresce o meu pesar

ha! essa minha saudade
nesse peito frouxo, esquisito
de tão grande já não cabe

acorda amor, o galo já cantou
vem ligeiro pro meu corpo
cometer mais um delito

quem não sabe o que é paixão,
deixe o dito por não dito.


Maria Júlia Pontes

sábado, 4 de agosto de 2007

Concreto amor marginal






e nos meus olhos de jabuticaba que não está madura
você embrenhou-se na verdura,
e nas curvas sinuosas à direita do meu corpo
você me amou... (um amor de esquerda),

politicamente incorretos,
nem chão, nem pão, nem teto,
apenas a Marginal, o frio, o rio,
amamos-nos cercados do concreto desejo marginal,

e agora não sei se rio
e você não sabe se há mar,
não sabemos da ponta do fio das horas
nem do aparato pra língua afiar.
(fui embora).

Maria Júlia Pontes