sábado, 8 de setembro de 2007

Aportar


O último pôr-do-sol
despencou no mar
acenando tchau!

e parecia rir de mim,
aquele sol rebuscado
em carmim,

ele sabia que a nau
não aportaria,
então ria,

nem veleiro, nem navio,
um displicente
extravio,

eu nunca mergulho
os pés primeiro,
vou de cabeça,

e rezo,
pra que nenhuma pedra
apareça,

inconseqüência ou não
prefiro me privar
da razão.

Maria Júlia Pontes

Lúgubre


No ventre da chuva
a minh’alma chora
em posição fetal,
escorre úmida
pelas entranhas
saltando minhas veias,
sentimento letal.

(Maria Júlia Pontes)

Estrangeira


A calmaria sempre vem
brincar no meu portão de ferro que range,
estranha, me deixa nos cantos,
uma falange de silêncios que tem lá seus encantos,

ela aparece do nada
não tem hora, nem dia,
toma-me num leve açoite,
transforma-me numa estranha arredia,

nossa relação é conturbada
ela sempre fica magoada,
o que posso fazer se ela finge
que sou afável, serena, estática esfinge,

sem nada a fazer ali parada,
devoro-a numa só talagada.

Maria Júlia Pontes

Malabarista


O amor me vem feito um menino,
fazendo malabarismos no farol
da esquina movimentada
do meu quintal cercado,

aparece do nada e me acusa
de rondar suas entradas
envoltas de arame farpado
feito uma intrusa,

eu, como quem não quer nada,
uso e abuso da alucinação tentadora
que me faz fogo inebriante em propagação
sem sentir suas ranhuras,

deleito-me no seu mundo absurdo,
finjo que não ouço seus gritos,
inebrio-me dos prazeres que me inundam,
não penso em suas recônditas agruras,

farto-me das suas concretas incertezas, e levito.


Maria júlia Pontes

Des(via)

O
 via
  duto
    júlio
      de
       mes
        quita
          Ne
          to
          é
          o
         teto
        da
       mes
      quita
    dos
   des
  va
 li
dos


Maria Júlia Pontes

Para sempre desvairada


O que é aquela cruz
no fim do túnel da Av. Rebouças
que o paulistano sustenta
[dia ....... após..... dia]
e que não se traduz?

luzes ao contrário trafegam nas vias
nas vidas dos transeuntes, Inferno e céu,
[se misturam]
ilustres, trabalhadores e otários
[Se aturam]

e desvaira pra nunca mais parar a paulicéia
nos palcos da multi-étnica platéia
que se arranha entre fumaça e pó
menino no farol...
[malabarista da fome]
um pouco de fé, e mais nada a temer,

meia volta vou ver!
e a única saída que alenta,
[desapressado]
não adianta correr,
[é esperar pra morrer]


Maria Júlia Pontes